Com a aprovação no dia 21 de novembro das Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público - (NBCASP) - o Conselho Federal de Contabilidade dá inicio a uma verdadeira revolução na Contabilidade Governamental brasileira.
A ênfase passa a ser o patrimônio como objeto de estudo da contabilidade enquanto ciência. O orçamento deixa de ser o protagonista da histórica da administração pública para se tornar um coadjuvante importante que trata do fluxo de caixa do Governo com base em autorização legislativa para arrecadar receitas e realizar despesas.
A mudança é grande e os profissionais de Contabilidade do serviço público terão que ficar preparados para essa virada de postura. Todos os fatos administrativos serão examinados e registrados não porque tem origem no orçamento, mas sim porque produzem alterações em algum elemento do ativo, passivo e patrimônio líquido.
Os Contadores que ainda crêem ser o orçamento o único input da Contabilidade e que as variações patrimoniais devem refletir o que foi “resultante da execução orçamentária” precisarão ler muitas vezes os artigos da Lei 4.320/64 a partir do número 83 que trata do processo de evidenciação dos elementos patrimoniais.
Trata-se de mudança radical que será vitoriosa na medida em que todos os Contadores do setor público passem a registrar em primeiro lugar as movimentações do patrimônio e posteriormente os reflexos de tal registro no sistema orçamentário pois somente a Contabilidade pode traduzir a riqueza patrimonial segundo o principio da competência vez que o orçamento esta intimamente ligado ao regime de caixa, para não falar do obscurantismo a que pode estar submetido por força das relações institucionais entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo. Rui Barbosa[1] tratou do tema orçamento e emitiu em determinada época a seguinte opinião:
“….os orçamentos são escandalosas mentiras, que escondem sob o nome de “receita” os empréstimos que a nossa pobreza nos obriga a contrair, e dissimulam com a expressão de saldos os déficits tenebrosos que assoberbam as nossas finanças”.
Após longas reflexões teóricas os Profissionais de Contabilidade com o apoio do Conselho Federal de Contabilidade concluíram pela autonomia da Ciência Contábil a partir do conhecimento mais profundo do patrimônio como seu objeto de estudos.
Tais estudos tem origem no inicio do século XX quando a contabilidade teve rápido desenvolvimento assumindo definitivamente a sua posição entre as ciências do conhecimento humano. Na atualidade podem ser encontradas as seguintes teorias contábeis:
a) De orientação meramente jurídica em que o Balanço é uma demonstração de direitos e obrigações de essência eminentemente jurídica.
b) De orientação instrumental em que o Balanço é uma recapitulação de contas, síntese final da Contabilidade.
c) De orientação econômica em que o Balanço tem o objetivo de evidenciar a real e verdadeira situação do patrimônio da entidade sem menosprezar as questões anteriores.
Portanto, é preciso levar em conta que no setor público as bases do orçamento e condições da contabilidade são primariamente consideradas em termos de caixa e de compromissos assumidos, embora em alguns casos como o registro da receita na fase da arrecadação, em que os recursos ainda não estão disponíveis, ou da inscrição na divida ativa em que o registro é efetuado como variação ativa com o propósito de identificar tais direitos e por conseguinte aumentar o patrimônio líquido.
Temos que reconhecer que a base de apropriação de caixa é muito mais em decorrência da tradição e do conservadorismo do que da racionalidade. Basicamente, o sistema orçamentário é visto como instrumento que indica os recursos e os limites de gasto autorizado para o período a que se refere. No passado tinha o objetivo de dar maior relevância ao Poder Legislativo em especial quando inexistiam as vinculações ou a vedação de emendas sobre certos assuntos. Naquela época cabia aos parlamentares, após as discussões e emendas, determinar a destinação dos recursos aos programas e projetos a serem executados durante todo o exercício.
Ocorre que muitas apropriações têm seu próprio ciclo de vida e não estão limitadas a um ano fiscal específico conforme, inclusive, esta previsto nos artigos 16 e 17 da Lei Complementar n. 101/2000 da Responsabilidade Fiscal. Será normal, portanto, que tais programas ou projetos, uma vez iniciados e apropriados tenham uma vida própria de mais de quatro ou cinco anos podendo ser estendidos, no caso de projetos até que no devido tempo eles se tornem componentes regulares do orçamento anual dando cobertura a atividades de caráter continuado.
Por isso o sistema de caixa foi modificado dando origem ao de compromissos que permite ao Poder Legislativo verificar a relevância de continuar um projeto ou um programa e determinar seu futuro. Entretanto, os limites do sistema orçamentário, em contraste, focam a quantia a ser gasta ou o limite que não poderá ser ultrapassado durante o ano fiscal. O objetivo é reconhecer anualmente o papel supremo do legislativo em matéria de orçamento dotando-o - a seu critério - de requisitos para a necessária flexibilidade por intermédio dos créditos adicionais.
Na medida em que estes sistemas evoluíram, seja pelas vinculações constitucionais ou pela inclusão na Lei de Responsabilidade Fiscal do conceito de despesas obrigatórias de caráter continuado ou, ainda, pela limitação de assuntos que não podem ser emendados pelo legislativo é comum observar uma redução gradativa do peso das implicações monetárias do orçamento, principalmente, pela necessidade cada vez maior de um fluxo de caixa projetado que exige conhecer os recebíveis e os compromissos de médio, curto e longo prazo, independentemente de sua passagem pelo orçamento.
Neste último aspecto é bom lembrar ainda que as vinculações orçamentárias ou a aprovação de projetos e atividades de caráter continuado são na realidade compromissos legais estabelecidos pelo próprio legislativo ao votar leis e orçamentos anteriores. Mais uma vez temos que render homenagem aos legisladores da Lei 4.320/64 ao definirem no § 1° do art. 12
Classificam-se como Despesas de Custeio as dotações para manutenção de serviços anteriormente criados, inclusive as destinadas a atender a obras de conservação e adaptação de bens imóveis.
Estabelecendo o que poderíamos denominar principio da anterioridade para o custeio da máquina pública que combinado com o artigo 16 e 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal indica claramente que legislaturas anteriores podem criar vínculos futuros para os recursos e, neste sentido, as legislaturas futuras ou se submetem a isso ou devem tomar iniciativa legislativa que rompa com esse comprometimento.
Este seria o caminho natural da Contabilidade Governamental, entretanto tal referencia foi abandonadas nos anos 70 tendo em vista que a ênfase durante toda essa década e a seguinte foi a perseguição das metas estabelecidas pela política macroeconômica apontada como necessária para a estabilização. É bom lembrar que na metade dos anos 80 o Governo Sarney não honrou a divida externa brasileira ficando submetido ao receituário do respectivo credor. Não é preciso lembrar que o sistema contábil com base em caixa estava intimamente comprometido com esta idéia e, desta forma, possibilitava melhor conciliação dos dados monetários com o objetivo de medir mais precisamente o impacto das operações orçamentárias na situação do crédito público e na economia em geral.
Depois de muitos anos fazendo os registros contábeis como reflexos da execução orçamentária de caixa com algumas exceções já tratadas acima, diversos países reiniciaram a preocupação com patrimônio público e conseqüentemente estão implantando o principio contábil da competência. Deve ser notado que estas alterações estão sendo realizadas em países que anteriormente tinham uma visão do orçamento como limitador de gastos
É preciso considerar que os termos obrigações, compromissos, sistema de caixa ou de competência não estão imunes a interpretações diversas, sob enfoques diversos e, conseqüentemente, não estão livres da ambigüidade. É sempre bom lembrar que para definir esses termos, é necessário recapitular as diversas etapas do processo orçamentário:
a) Quando o orçamento é concebido e encaminhado ao Poder Legislativo refere-se a uma provável arrecadação de receita e uma possível quantia a ser desembolsada durante o período anual a que se refere.
b) Uma vez aprovado o orçamento verifica-se a implementação de uma série de etapas que didaticamente são denominados estágios da receita e da despesa:
Na receita
i. Estabelecimento da base tributária (receita derivada) e das demais receitas (receita originária) e administração cadastral.
ii. Aprovação da Receita por rubricas, sub rubricas, etc. (Previsão)
iii. Lançamento tributário (nas suas diversas modalidades)
1. Direto (ex oficio)
2. Por declaração
3. Por homologação
iv. Arrecadação (recebimento por parte da Rede Bancária)
v. Recolhimento (a Rede Bancária entrega os recursos ao Tesouro).
Na Despesa
i. Distribuição das dotações orçamentárias (créditos orçamentários),
ii. Alocação dos recursos através do Quadro de detalhamento da Despesa e do Quadro de Detalhamento da Receita
iii. Contratação de uma transação mediante um pedido ou uma solicitação com o registro do compromisso (empenho).
iv. Nascimento da obrigação quando o fornecedor ou prestador do serviço entrega o material ou o serviço (implemento de condição)
v. Despesa indicando a conta onde o uso dos materiais ou serviços é registrada (liquidação da despesa).
vi. Desembolso para registrar o pagamento;
Examinando as etapas acima é possível afirmar, sem sombra de dúvida, que todos os sistemas de contabilidade, independentemente da origem ou orientação e prática atual, permitem o registro das várias fases. Entretanto, tais eventos ou fatos administrativos, tanto podem ter seu registro efetuado com base em caixa como em obediência ao princípio da competência.
Em um sistema de contabilidade baseado em caixa, são registradas somente as receitas e despesas quando o dinheiro é recebido ou pago. O sistema não leva em conta o período a que tais transações se referem. Já a contabilidade por competência refere-se à aquisição de bens e serviços independentemente da afetação do caixa da entidade.
Porque competência?
É preciso reconhecer que a contabilidade por caixa facilita a avaliação do impacto na atividade fiscal, a reconciliação dos dados monetários e o controle dos recursos disponíveis. Porem, o sistema de caixa é insuficiente para indicar de forma imediata e mesmo a médio e longo prazo as responsabilidades obrigacionais dos governos como é o caso das responsabilidades previdenciárias, geralmente suavizadas e muito freqüentemente (ou sempre) com valores incluídos no orçamento de cada ano bem menores do que os valores efetivamente executados. Além disso, na contabilidade baseada em caixa, são registradas transações relativas a pagamentos sem informar de modo imediato se o pagamento efetuado refere-se a serviços executados durante o exercício corrente ou de anos anteriores.
Ocorre que o equilíbrio entre os pagamentos com a receita e o custo dos serviços num mesmo prazo (ano fiscal) é tarefa bastante difícil tendo em vista que a informação sobre responsabilidades (passivo) não é captada completamente. Neste sentido cabe a todos que atuam no setor público refletir que a contabilidade com base em caixa pode, de modo involuntário, contribuir para distorcer a decisão de natureza fiscal do volume e valor das obrigações assumidas e que precisam ser realizadas. Em face disso não é improvável que o legislativo seja chamado para prover aprovação de desembolso de obrigações já incorridas.
Em contraste com o sistema de caixa, o sistema contábil da competência procura fornecer um quadro com todos os recebíveis e responsabilidades do governo e, em conseqüência, constitui uma ferramenta de auxilio na formulação de políticas fiscais mais realísticas. Também facilita a gestão de caixa por permitir o conhecimento de todos os ativos geradores de caixa e do universo das obrigações que pesam sobre esse mesmo caixa.
Alem disso, o sistema de competência auxilia os tomadores de decisão a enxergar além do ano fiscal atual e do orçamento do próximo ano. Durante períodos de crise fiscal aguda, o sistema de contabilidade por competência permite para os tomadores de decisão ver além das transações da semana ou do mês e enxergar um horizonte de tempo maior e, em particular, focalizar as responsabilidades contingentes e passivos omitidos, que afetem períodos futuros. Com isso é mantida a consistência e evita-se que a Contabilidade Governamental fique submetida aos ciclos políticos de curto prazo levando o cidadão e os novos administradores a conhecerem todos os ativos e passivos da entidade. Subsidiariamente permite que os novos governantes identifiquem situações na qual governantes em final de mandato armem bombas com espoletas de retardo para serem acionadas no inicio de novos períodos de governo.
Por outro lado, no gerenciamento dos programas constantes das ações orçamentárias a contabilidade por competência pode demonstrar os custos totais incorridos, além dos fluxos de caixa, os custos indiretos e seu rateio, inclusive o valor do ativos tangíveis utilizados na prestação dos serviços à população. Da mesma forma, estimativas dos recursos totais, alem de auxiliar na alocação dos recursos orçamentários também facilita a tomada de decisões sobre quais os serviços que devem ser prestados pela própria administração publica e quais os que devem ser fornecidos por empresas privadas.
A discussão do assunto tende a focalizar os méritos relativos de uma forma de contabilização sobre a outra (Caixa x Competência). Na realidade, as relações entre os dois é simbólica e tanto um como outro não podem ser considerados isoladamente. O sistema de caixa é menos complexo e mais fácil de gerenciar e estamos certos que sua primeira escolha ou preferência decorre muito mais do número de anos em que foi ensinado e praticado. Também é verdade que tem vários pontos obscuros e, alem de não informar sobre questões futuras, não atende a demandas mais complexas dos tomadores de decisão. Precisa ser completado pela contabilidade baseada na competência para fornecer um quadro mais completo das responsabilidade e do custo das operações.
Quando são registrados pagamentos em um sistema de caixa, é assumido que bens e serviços foram entregues e que as responsabilidades associadas estão sendo liquidadas. Reciprocamente, um sistema de competência assume que quando os passivos são registrados, estão sendo feitos esforços para seu financiamento. Juntos, os dois sistemas fornecem uma informação completa, e o gerente responsável pela arrecadação de receitas e realização das despesas será melhor servido por demonstrativos com foco na gestão de caixa e com foco na gestão do patrimônio da entidade.
Finalmente, a leitura atenta da Lei de Responsabilidade Fiscal já estabelece a preferência pelo regime de competência, mas em caráter complementar determina a apuração dos fluxos financeiros pelo regime de caixa (orçamento). Tal redação consta do inciso II do artigo 50 e representa, para nós, a materialização da importância da evidenciação do patrimônio com objeto de estudos da contabilidade.
[1] Discursos e Conferências: Porto: Emp. Literária e Tipografia, 1907, p. 13. Apud. Ricardo Lobo Torres, Tratado de Direito Constitucional, Financeiro e Tributário. Ed. Renovar, Vol. 5, p. 31/32
A ênfase passa a ser o patrimônio como objeto de estudo da contabilidade enquanto ciência. O orçamento deixa de ser o protagonista da histórica da administração pública para se tornar um coadjuvante importante que trata do fluxo de caixa do Governo com base em autorização legislativa para arrecadar receitas e realizar despesas.
A mudança é grande e os profissionais de Contabilidade do serviço público terão que ficar preparados para essa virada de postura. Todos os fatos administrativos serão examinados e registrados não porque tem origem no orçamento, mas sim porque produzem alterações em algum elemento do ativo, passivo e patrimônio líquido.
Os Contadores que ainda crêem ser o orçamento o único input da Contabilidade e que as variações patrimoniais devem refletir o que foi “resultante da execução orçamentária” precisarão ler muitas vezes os artigos da Lei 4.320/64 a partir do número 83 que trata do processo de evidenciação dos elementos patrimoniais.
Trata-se de mudança radical que será vitoriosa na medida em que todos os Contadores do setor público passem a registrar em primeiro lugar as movimentações do patrimônio e posteriormente os reflexos de tal registro no sistema orçamentário pois somente a Contabilidade pode traduzir a riqueza patrimonial segundo o principio da competência vez que o orçamento esta intimamente ligado ao regime de caixa, para não falar do obscurantismo a que pode estar submetido por força das relações institucionais entre o Poder Executivo e o Poder Legislativo. Rui Barbosa[1] tratou do tema orçamento e emitiu em determinada época a seguinte opinião:
“….os orçamentos são escandalosas mentiras, que escondem sob o nome de “receita” os empréstimos que a nossa pobreza nos obriga a contrair, e dissimulam com a expressão de saldos os déficits tenebrosos que assoberbam as nossas finanças”.
Após longas reflexões teóricas os Profissionais de Contabilidade com o apoio do Conselho Federal de Contabilidade concluíram pela autonomia da Ciência Contábil a partir do conhecimento mais profundo do patrimônio como seu objeto de estudos.
Tais estudos tem origem no inicio do século XX quando a contabilidade teve rápido desenvolvimento assumindo definitivamente a sua posição entre as ciências do conhecimento humano. Na atualidade podem ser encontradas as seguintes teorias contábeis:
a) De orientação meramente jurídica em que o Balanço é uma demonstração de direitos e obrigações de essência eminentemente jurídica.
b) De orientação instrumental em que o Balanço é uma recapitulação de contas, síntese final da Contabilidade.
c) De orientação econômica em que o Balanço tem o objetivo de evidenciar a real e verdadeira situação do patrimônio da entidade sem menosprezar as questões anteriores.
Portanto, é preciso levar em conta que no setor público as bases do orçamento e condições da contabilidade são primariamente consideradas em termos de caixa e de compromissos assumidos, embora em alguns casos como o registro da receita na fase da arrecadação, em que os recursos ainda não estão disponíveis, ou da inscrição na divida ativa em que o registro é efetuado como variação ativa com o propósito de identificar tais direitos e por conseguinte aumentar o patrimônio líquido.
Temos que reconhecer que a base de apropriação de caixa é muito mais em decorrência da tradição e do conservadorismo do que da racionalidade. Basicamente, o sistema orçamentário é visto como instrumento que indica os recursos e os limites de gasto autorizado para o período a que se refere. No passado tinha o objetivo de dar maior relevância ao Poder Legislativo em especial quando inexistiam as vinculações ou a vedação de emendas sobre certos assuntos. Naquela época cabia aos parlamentares, após as discussões e emendas, determinar a destinação dos recursos aos programas e projetos a serem executados durante todo o exercício.
Ocorre que muitas apropriações têm seu próprio ciclo de vida e não estão limitadas a um ano fiscal específico conforme, inclusive, esta previsto nos artigos 16 e 17 da Lei Complementar n. 101/2000 da Responsabilidade Fiscal. Será normal, portanto, que tais programas ou projetos, uma vez iniciados e apropriados tenham uma vida própria de mais de quatro ou cinco anos podendo ser estendidos, no caso de projetos até que no devido tempo eles se tornem componentes regulares do orçamento anual dando cobertura a atividades de caráter continuado.
Por isso o sistema de caixa foi modificado dando origem ao de compromissos que permite ao Poder Legislativo verificar a relevância de continuar um projeto ou um programa e determinar seu futuro. Entretanto, os limites do sistema orçamentário, em contraste, focam a quantia a ser gasta ou o limite que não poderá ser ultrapassado durante o ano fiscal. O objetivo é reconhecer anualmente o papel supremo do legislativo em matéria de orçamento dotando-o - a seu critério - de requisitos para a necessária flexibilidade por intermédio dos créditos adicionais.
Na medida em que estes sistemas evoluíram, seja pelas vinculações constitucionais ou pela inclusão na Lei de Responsabilidade Fiscal do conceito de despesas obrigatórias de caráter continuado ou, ainda, pela limitação de assuntos que não podem ser emendados pelo legislativo é comum observar uma redução gradativa do peso das implicações monetárias do orçamento, principalmente, pela necessidade cada vez maior de um fluxo de caixa projetado que exige conhecer os recebíveis e os compromissos de médio, curto e longo prazo, independentemente de sua passagem pelo orçamento.
Neste último aspecto é bom lembrar ainda que as vinculações orçamentárias ou a aprovação de projetos e atividades de caráter continuado são na realidade compromissos legais estabelecidos pelo próprio legislativo ao votar leis e orçamentos anteriores. Mais uma vez temos que render homenagem aos legisladores da Lei 4.320/64 ao definirem no § 1° do art. 12
Classificam-se como Despesas de Custeio as dotações para manutenção de serviços anteriormente criados, inclusive as destinadas a atender a obras de conservação e adaptação de bens imóveis.
Estabelecendo o que poderíamos denominar principio da anterioridade para o custeio da máquina pública que combinado com o artigo 16 e 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal indica claramente que legislaturas anteriores podem criar vínculos futuros para os recursos e, neste sentido, as legislaturas futuras ou se submetem a isso ou devem tomar iniciativa legislativa que rompa com esse comprometimento.
Este seria o caminho natural da Contabilidade Governamental, entretanto tal referencia foi abandonadas nos anos 70 tendo em vista que a ênfase durante toda essa década e a seguinte foi a perseguição das metas estabelecidas pela política macroeconômica apontada como necessária para a estabilização. É bom lembrar que na metade dos anos 80 o Governo Sarney não honrou a divida externa brasileira ficando submetido ao receituário do respectivo credor. Não é preciso lembrar que o sistema contábil com base em caixa estava intimamente comprometido com esta idéia e, desta forma, possibilitava melhor conciliação dos dados monetários com o objetivo de medir mais precisamente o impacto das operações orçamentárias na situação do crédito público e na economia em geral.
Depois de muitos anos fazendo os registros contábeis como reflexos da execução orçamentária de caixa com algumas exceções já tratadas acima, diversos países reiniciaram a preocupação com patrimônio público e conseqüentemente estão implantando o principio contábil da competência. Deve ser notado que estas alterações estão sendo realizadas em países que anteriormente tinham uma visão do orçamento como limitador de gastos
É preciso considerar que os termos obrigações, compromissos, sistema de caixa ou de competência não estão imunes a interpretações diversas, sob enfoques diversos e, conseqüentemente, não estão livres da ambigüidade. É sempre bom lembrar que para definir esses termos, é necessário recapitular as diversas etapas do processo orçamentário:
a) Quando o orçamento é concebido e encaminhado ao Poder Legislativo refere-se a uma provável arrecadação de receita e uma possível quantia a ser desembolsada durante o período anual a que se refere.
b) Uma vez aprovado o orçamento verifica-se a implementação de uma série de etapas que didaticamente são denominados estágios da receita e da despesa:
Na receita
i. Estabelecimento da base tributária (receita derivada) e das demais receitas (receita originária) e administração cadastral.
ii. Aprovação da Receita por rubricas, sub rubricas, etc. (Previsão)
iii. Lançamento tributário (nas suas diversas modalidades)
1. Direto (ex oficio)
2. Por declaração
3. Por homologação
iv. Arrecadação (recebimento por parte da Rede Bancária)
v. Recolhimento (a Rede Bancária entrega os recursos ao Tesouro).
Na Despesa
i. Distribuição das dotações orçamentárias (créditos orçamentários),
ii. Alocação dos recursos através do Quadro de detalhamento da Despesa e do Quadro de Detalhamento da Receita
iii. Contratação de uma transação mediante um pedido ou uma solicitação com o registro do compromisso (empenho).
iv. Nascimento da obrigação quando o fornecedor ou prestador do serviço entrega o material ou o serviço (implemento de condição)
v. Despesa indicando a conta onde o uso dos materiais ou serviços é registrada (liquidação da despesa).
vi. Desembolso para registrar o pagamento;
Examinando as etapas acima é possível afirmar, sem sombra de dúvida, que todos os sistemas de contabilidade, independentemente da origem ou orientação e prática atual, permitem o registro das várias fases. Entretanto, tais eventos ou fatos administrativos, tanto podem ter seu registro efetuado com base em caixa como em obediência ao princípio da competência.
Em um sistema de contabilidade baseado em caixa, são registradas somente as receitas e despesas quando o dinheiro é recebido ou pago. O sistema não leva em conta o período a que tais transações se referem. Já a contabilidade por competência refere-se à aquisição de bens e serviços independentemente da afetação do caixa da entidade.
Porque competência?
É preciso reconhecer que a contabilidade por caixa facilita a avaliação do impacto na atividade fiscal, a reconciliação dos dados monetários e o controle dos recursos disponíveis. Porem, o sistema de caixa é insuficiente para indicar de forma imediata e mesmo a médio e longo prazo as responsabilidades obrigacionais dos governos como é o caso das responsabilidades previdenciárias, geralmente suavizadas e muito freqüentemente (ou sempre) com valores incluídos no orçamento de cada ano bem menores do que os valores efetivamente executados. Além disso, na contabilidade baseada em caixa, são registradas transações relativas a pagamentos sem informar de modo imediato se o pagamento efetuado refere-se a serviços executados durante o exercício corrente ou de anos anteriores.
Ocorre que o equilíbrio entre os pagamentos com a receita e o custo dos serviços num mesmo prazo (ano fiscal) é tarefa bastante difícil tendo em vista que a informação sobre responsabilidades (passivo) não é captada completamente. Neste sentido cabe a todos que atuam no setor público refletir que a contabilidade com base em caixa pode, de modo involuntário, contribuir para distorcer a decisão de natureza fiscal do volume e valor das obrigações assumidas e que precisam ser realizadas. Em face disso não é improvável que o legislativo seja chamado para prover aprovação de desembolso de obrigações já incorridas.
Em contraste com o sistema de caixa, o sistema contábil da competência procura fornecer um quadro com todos os recebíveis e responsabilidades do governo e, em conseqüência, constitui uma ferramenta de auxilio na formulação de políticas fiscais mais realísticas. Também facilita a gestão de caixa por permitir o conhecimento de todos os ativos geradores de caixa e do universo das obrigações que pesam sobre esse mesmo caixa.
Alem disso, o sistema de competência auxilia os tomadores de decisão a enxergar além do ano fiscal atual e do orçamento do próximo ano. Durante períodos de crise fiscal aguda, o sistema de contabilidade por competência permite para os tomadores de decisão ver além das transações da semana ou do mês e enxergar um horizonte de tempo maior e, em particular, focalizar as responsabilidades contingentes e passivos omitidos, que afetem períodos futuros. Com isso é mantida a consistência e evita-se que a Contabilidade Governamental fique submetida aos ciclos políticos de curto prazo levando o cidadão e os novos administradores a conhecerem todos os ativos e passivos da entidade. Subsidiariamente permite que os novos governantes identifiquem situações na qual governantes em final de mandato armem bombas com espoletas de retardo para serem acionadas no inicio de novos períodos de governo.
Por outro lado, no gerenciamento dos programas constantes das ações orçamentárias a contabilidade por competência pode demonstrar os custos totais incorridos, além dos fluxos de caixa, os custos indiretos e seu rateio, inclusive o valor do ativos tangíveis utilizados na prestação dos serviços à população. Da mesma forma, estimativas dos recursos totais, alem de auxiliar na alocação dos recursos orçamentários também facilita a tomada de decisões sobre quais os serviços que devem ser prestados pela própria administração publica e quais os que devem ser fornecidos por empresas privadas.
A discussão do assunto tende a focalizar os méritos relativos de uma forma de contabilização sobre a outra (Caixa x Competência). Na realidade, as relações entre os dois é simbólica e tanto um como outro não podem ser considerados isoladamente. O sistema de caixa é menos complexo e mais fácil de gerenciar e estamos certos que sua primeira escolha ou preferência decorre muito mais do número de anos em que foi ensinado e praticado. Também é verdade que tem vários pontos obscuros e, alem de não informar sobre questões futuras, não atende a demandas mais complexas dos tomadores de decisão. Precisa ser completado pela contabilidade baseada na competência para fornecer um quadro mais completo das responsabilidade e do custo das operações.
Quando são registrados pagamentos em um sistema de caixa, é assumido que bens e serviços foram entregues e que as responsabilidades associadas estão sendo liquidadas. Reciprocamente, um sistema de competência assume que quando os passivos são registrados, estão sendo feitos esforços para seu financiamento. Juntos, os dois sistemas fornecem uma informação completa, e o gerente responsável pela arrecadação de receitas e realização das despesas será melhor servido por demonstrativos com foco na gestão de caixa e com foco na gestão do patrimônio da entidade.
Finalmente, a leitura atenta da Lei de Responsabilidade Fiscal já estabelece a preferência pelo regime de competência, mas em caráter complementar determina a apuração dos fluxos financeiros pelo regime de caixa (orçamento). Tal redação consta do inciso II do artigo 50 e representa, para nós, a materialização da importância da evidenciação do patrimônio com objeto de estudos da contabilidade.
[1] Discursos e Conferências: Porto: Emp. Literária e Tipografia, 1907, p. 13. Apud. Ricardo Lobo Torres, Tratado de Direito Constitucional, Financeiro e Tributário. Ed. Renovar, Vol. 5, p. 31/32
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