Sped: uma revolução no país do "jeitinho"!
Sou um entusiasta do projeto Sped. Acredito que hoje todos os que lêem este artigo sabem que Sped significa Sistema Público de Escrituração Digital, que engloba três projetos: Nota Fiscal Eletrônica, Escrituração Fiscal Digital e Escrituração Contábil Digital, também conhecidos como NF-e, Sped Fiscal e Sped Contábil.
São projetos bastante complexos e, conseqüentemente, muito onerosos, tanto para a União e para os estados quanto, principalmente, para as centenas de milhares de empresas que têm de se adaptar. O custo total está na casa de bilhões de reais. Algo em torno de R$ 100 bilhões nos próximos dois anos.
O custo é alto, mas e os benefícios? No meu entender, são muitos no médio prazo e muitíssimos no longo. O principal objetivo do projeto Sped é, sem disfarces, forçar os agentes econômicos a cumprir seus deveres estipulados em lei, induzir agentes informais ou semiformais (ou seja, sonegadores) a "andar na linha" e, em última análise, aumentar a arrecadação.
Leis existem para serem cumpridas. Não faltam leis para melhorar o Brasil, o que falta é o seu cumprimento e punição para os infratores. O Brasil é conhecido internacionalmente e, infelizmente, se orgulha disso, como o "país do jeitinho". Aqui tudo se contorna, se ajeita, é dando que se recebe, seu guarda eu não sabia, alivia pra mim, toma aqui sua cervejinha, deixa por isso mesmo, também quero essa boquinha, para vender para governo tem que pagar propina, corromper não é imoral, imoral é ser corrompido, e por aí vai.
A Justiça deveria fazer valer as leis, mas é morosa, burocrática e humana também, ou seja, corruptível. Mas isso é outro capítulo, sobre o qual eu não saberia discorrer, a não ser como espectador incapaz, frágil e impotente como qualquer brasileiro.
Pois bem, e onde entra o Sped? O Sped entra porque é o agente que obriga as empresas a se abrirem, a serem transparentes em sua operação. Com o Sped as empresas terão que informar, em "real time", seu faturamento, sua geração de impostos, sua contabilidade. É como se você estivesse em permanente fiscalização on-line. Isso dificulta, em muito, a sonegação, as operações "não contabilizadas" (termo consagrado atualmente), enfim, a venda sem nota, a maracutaia, o "caixa 2" e outras baixarias tão comuns nos países atrasados.
Posso parecer ingênuo. Não é uma aposta, é uma esperança. Mas é uma esperança bem fundamentada na tecnologia, na disponibilização on-line de informações que possibilitam o cruzamento de dados, a auditoria imediata pelos computadores da Receita Federal e das secretarias de Fazenda. É como se milhares de fiscais estivessem escrutinando seus dados à velocidade da luz e, se algo parecer estranho, não usual, fora dos padrões, então manda um fiscal humano investigar de perto. Meu entusiasmo, mais do que uma aposta, é um desejo. Desejo de ver o Brasil melhorar, tornar-se mais seguidor das regras de negócio, mais desenvolvido, mais competitivo. Mais honesto.
Com mais gente pagando impostos, com aumento de arrecadação (nunca vi nenhum número oficial, mas estimo que possa ser da ordem de brutais 20%), nós, empresários, esperamos e exigiremos também uma diminuição da carga tributária que, de tão alta, é o maior estímulo à sonegação. Creio e espero que isso forme um círculo virtuoso de maior base de contribuintes - menos sonegação - mais arrecadação - que possibilita menor carga tributária -; mais contribuintes - menos sonegação -; maior arrecadação.
Como brasileiro, como cidadão e como contribuinte, quero acreditar que o maior ganho que teremos com o projeto Sped será didático. Assim como aprendemos a usar e confiar no cinto de segurança porque ele nos foi imposto, o Sped poderá ensinar os agentes econômicos a serem mais corretos, mais cumpridores, menos subdesenvolvidos. Pode moralizar nosso estilo de negócios, nos tornar mais parecidos com os vencedores, nos fazer mais competitivos no mercado global. Pode, e isto é apenas um sonho meu, promover uma mudança cultural no sentido da lisura e da ética. Espero que o Sped seja mesmo uma revolução.
Abaixo o jeitinho!
Fonte: Gazeta Mercantil - 11/12/2008 - Caderno A - Pág. 3 -WERNER DIETSCHI
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