Parte IV - Final:
Encontra-se
aberta pelo Conselho Federal de Contabilidade a Audiência Pública da minuta da
norma ITG 2004 – Interação da Entidade com o Meio Ambiente.
Sugestões
e comentários devem ser enviados até 10/08/2013
ao Conselho Federal de Contabilidade - endereço eletrônico: ap.nbc@cfc.org.br,
fazendo referência à minuta.
Esse
Blog divulgará nos próximos posts contribuições e comentários elaborados pelo
colega Paulo Homero Júnior, do PPGCC FEA/USP.
Contamos
com seus comentários!
O texto a seguir é a parte final dos comentários do Paulo Homero Júnior sobre a minuta proposta e ainda em discussão:
UMA PROPOSTA
ALTERNATIVA PARA A REDAÇÃO DOS ITENS 18 E 19 DA ITG 2004
Para
não me limitar apenas às críticas, abaixo sugiro uma redação alternativa para
os itens 18 e 19 da ITG 2004, e na sequência argumento por que acredito que tal
redação seria mais conveniente:
18. A entidade
deve divulgar se assume ou não compromissos de sustentabilidade em suas operações
e de responsabilidade ambiental e social através de declarações públicas. Caso
a entidade emita declarações destas naturezas, deve evidenciar quais são estas
declarações e como elas impactaram suas atividades durante o período abrangido pelas
demonstrações financeiras. A entidade deve evidenciar também se eventuais
falhas no cumprimento destes compromissos geraram obrigações não formalizadas,
nos termos do item 17 do CPC 25, ou então as razões pelas quais estas falhas
não geraram obrigações.
19. Ao atender
aos requisitos do item 18, a entidade deve levar em conta que a evidenciação de
falhas no cumprimento de compromissos assumidos através de declarações públicas
possuem valor confirmatório para a avaliação de seu comprometimento com tais declarações,
mesmo que estas falhas representem valores de baixa magnitude.
Diante
da redação que proponho, uma possível forma de evidenciação do exemplo que apresentei
seria a seguinte:
Compromisso
|
Grau
de cumprimento
|
Reconhecimento
de obrigação construtiva?
|
Neutralização
das emissões de GEE
|
30%
|
Não
– A companhia se encontra em processo de adaptação de seus procedimentos, e
vem promovendo uma série de discussões junto a seus colaboradores, clientes,
fornecedores e a comunidade em geral, visando adequar-se o mais breve
possível ao cumprimento do compromisso firmado em seu site.
|
Acredito
que esta redação também faria com que as empresas pensassem duas vezes antes de
emitir declarações de responsabilidade ambiental, sabendo que elas seria m alvo
de escrutínio em suas demonstrações contábeis.
Mas
mais do que isso, acredito que ela esteja mais alinhada ao objetivo de
fidelidade representacional que deve permear a elaboração de demonstrações
financeiras. Há muitas companhias que dizem uma coisa e fazem outra? Pois ao
invés de contabilizarmos o que elas dizem, proponho que evidenciemos a
discrepância entre seus discursos e práticas.
Com
a redação que proponho ao item 19, ignorar os requisitos de divulgação da ITG
2004 sob o pretexto de que eles não são materiais deixaria de ser uma opção. E
tal disposição encontra suporte, e meu ver, nos itens QC7, QC9 e QC11 da
Estrutura Conceitual, cumprindo com o objetivo de ser consistente às normas
internacionais.
Neste
caso, o contador da Cia. ABC estaria em uma posição muito menos confortável: já
não lhe bastaria apenas acompanhar as declarações da empresa e as ir
contabilizando conforme algum modelo qualquer, em que um simples ajuste na taxa
de desconto utilizada pode resolver maiores problemas; ele teria que ter uma
postura crítica, ativa, e avaliar se a empresa vem de fato cumprindo com o que
diz ou apenas usando o discurso de responsabilidade ambiental como peça de marketing.
Teria
que exercer um maior grau de julgamento profissional, assumindo o dever de
prestar contas, ou como se diria em inglês, give
an account, contar uma história a respeito do desempenho ambiental da
empresa.
Da
mesma forma o auditor se exporia a um risco de auditoria maior, tendo que
realizar procedimentos não só para acompanhar as declarações da companhia,
mas também o grau de comprometimento
dela com tais declarações.
Mas
mais importante do que tudo isso, creio que os usuários das demonstrações
contábeis teriam melhores condições de avaliar o desempenho das empresas, e a
partir destas avaliações, tomar as atitudes que julgarem devidas.
No
afã de tornarmos o mundo um lugar melhor, não podemos superestimar o poder da contabilidade.
Não creio que ao contabilizarmos o que as empresas dizem, estaremos
contribuindo em grande escala para que elas façam o que digam. Pior do que
isso, temo seriamente que acabemos contribuindo para que elas mascarem suas
ações.
No
entanto, acredito sim que a contabilidade possa exercer um papel social
importante, tendo sido este inclusive o tema do trabalho que me levou ao III
CSEAR. Ao expor as contradições entre os discursos e as práticas das organizações,
a contabilidade pode servir de ferramenta emancipatória, permitindo que setores organizados da
sociedade civil, como sindicatos, movimentos estudantis, associações de
consumidores, de moradores, etc., questionem estas contradições e cobrem soluções
por partes das empresas, de tal forma que a elas não reste alternativa realista
senão assumir responsabilidades por suas declarações. Aí sim, tais declarações passarão
a originar obrigações construtivas.
REFERÊNCIAS
HENDRIKSEN,
E.; BREDA, M. VAN. Teoria da contabilidade. São Paulo: Atlas, 2007.
MAHONEY, L. S.
et al. A research note on standalone corporate social responsibility reports: Signaling
or greenwashing? Critical Perspectives on Accounting, v. 24, n. 4-5, p.
350-359, jun. 2013.