Fiona Harvey, Financial Times, de Londres
Os sistemas de comercialização de créditos de carbono em todo o mundo estão numa encruzilhada: um caminho leva ao declínio e fracasso, outro produzirá uma enorme explosão de investimentos. O rumo que vierem a tomar dependerá do que for decidido na conferência sobre mudanças climáticas que tem início em Copenhague hoje.
A retomada do extremamente criticado esquema da ONU e sua adequação a uma expansão potencialmente grande será um item importante na agenda.
Se não houver concordância entre os governos, o programa da ONU - que pretendia ser o sistema mundial predominante de comercialização de créditos de carbono, mas que se revelou distante disso - poderá tornar-se pouco mais do que uma irrelevância. Mas, se o sistema puder ser reformulado e tornado efetivamente mundial, mediante a inclusão dos atualmente excluídos EUA, então a comercialização será chave para a reação do mundo às mudanças climáticas.
"É preciso termos algo decidido sobre [a comercialização de créditos de carbono]", disse John Browne, ex-CEO da BP.
Mas ele enfatizou que o mecanismo precisa ser aperfeiçoado, uma posição com que a maioria dos profissionais no setor do carbono deve concordar.
O mercado mundial de gases causadores do efeito estufa cresceu de zero, em 2005, quando o Protocolo de Kyoto entrou em vigor, para cerca de US$ 125 bilhões no ano passado, apesar da crise financeira, segundo a Point Carbon, uma empresa de análises.
Caso os EUA venham a participar da comercialização de créditos de carbono, o que hoje não acontece porque o país não ratificou o Protocolo de Kyoto, o valor global do mercado rapidamente cresceria de várias centenas de bilhões de dólares, estima a Point Carbon, podendo chegar a US$ 3 trilhões em 2020.
Nos termos dos atuais projetos de lei contemplando sistemas de limitação e comercialização de direitos de emissão nos EUA, as companhias envolvidas em um sistema federal de comercialização de créditos de carbono poderiam comprar milhões de créditos de carbono em outros países. Assim, o envolvimento dos EUA será crucial.
A ausência americana é um dos dois principais problemas que se colocam como obstáculo ao crescimento do sistema de comercialização de carbono da ONU - o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). O outro é estrutural. A arquitetura do MDL provocou críticas generalizadas.
Henry Derwent, executivo-chefe da International Emissions Trading Association, uma entidade comercial, está preocupado que problemas envolvendo o mecanismo americano possam levar os EUA a rejeitar o sistema, "a menos que seja possível demonstrar rapidamente que ele é capaz de funcionar com mais harmonia".
Quase todos os envolvidos - a ONU, os países mais desenvolvidos e muitos dos países em desenvolvimento - querem ver uma reformulação do MDL. E rápida. Mas há problemas.
A primeira dificuldade está na própria diretoria executiva do mecanismo. Atualmente, os projetos precisam ser aprovados pela diretoria, que tem poucos membros, fundos escassos e admite estar em dificuldades para processar o volume de pedidos que lhe são encaminhados.
Lex de Jonge, seu diretor, disse ao "Financial Times" que a diretoria não consegue dar conta de mais de 1 mil projetos por ano, um número esperado caso haja êxito nas negociações em Copenhague. Ele deseja uma reforma que permita à diretoria delegar parte de seu mandato a outra comissão, que ficaria encarregada de certificar projetos individuais.
Mas a ONU reconhece que mudanças mais abrangentes serão necessárias. Atualmente, os projetos são tratados caso a caso, mas esse procedimento é intrinsecamente lento e gera muita complicação burocrática. Em Copenhague, os governos discutirão mudanças que permitiriam a muitos projetos ser considerados em conjunto, ou mesmo que os créditos de carbono não seriam concedidos a projetos, mas sim a países.
Uma ideia é que a ONU deveria estar capacitada a definir referenciais gerais válidos para determinados setores de atividade ou países, e então conceder créditos com base nos êxito relativo desses setores ou países em reduzir suas emissões em comparação com esses parâmetros de referência. Isso permitiria que o sistema de comercialização crescesse rapidamente em escala.
Essa condição seria essencial para participação americana, disse Kristian Tangen, da Point Carbon. "Haverá necessidade de enorme ampliação de escala no MDL se os EUA assumirem uma meta [de corte de emissões de carbono]".
Outras possíveis mudanças incluem reformas no conceito de "adicionalidade".
De Jonge disse que certos projetos, como esquemas complexos de eficiência energética que exigem grandes investimentos iniciais, poderiam ser considerados "adicionais" sem ter de prová-lo.
Mesmo que Copenhague consiga cumprir pouca coisa mais, especialistas emissões de carbono gostariam de ver esse critério revisto rapidamente. "'Adicionalidade' é provavelmente a área mais crítica da reforma", disse Abyd Karmali, diretor mundial de emissões no Merrill Lynch e presidente da Carbon Markets and Investors Association.
Uma reforma será vital para enfrentar as mudanças climáticas, diz Paul Bledsoe, da Comissão Nacional para Política Energética dos EUA. "O desenvolvimento de uma arquitetura financeira eficaz exigirá que governos e especialistas financeiros no mundo inteiro se engagem plenamente. Esse não é um aspecto secundário, mas a viga mestra de qualquer reação mundial efetiva."
8 de dez. de 2009
Crédito de carbono chega a encruzilhada
Texto publicado no Jornal Valor Econômico (07 Dez. 2009)
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