O Jornal Valor
Econômico publicará uma série de cinco artigos sobre os impactos das novas normas
contábeis. Detalhe: impactos das novas normas contábeis na visão de um
advogado!
O primeiro artigo da
série trata sobre dividendos. Segue o texto para leitura!
Dividendos no contexto
do IFRS
Texto de Edison Carlos
Fernandes (Doutor em Direito - PUC-SP) e, pelo visto, estudioso de questões
contábeis - Valor Econômico - 28/11/2011
Apesar de ainda existir
um longo caminho a percorrer, a adoção do padrão internacional de contabilidade
(IFRS) pelas empresas brasileiras já está na pauta do dia. Trata-se de uma
preocupação não somente do pessoal ligado à área contábil, mas de todos aqueles
envolvidos com a situação econômico-financeira da empresa, especialmente
advogados e profissionais das relações com investidores. Do outro lado, os
reflexos da implementação dos IFRS também têm sido estudados pelos sócios
(acionistas ou quotistas), investidores e pela Receita Federal do Brasil, sendo
um ponto importante a distribuição de dividendos. [Um dos mais importantes,
inclusive]
Lembre-se, desde logo,
que o padrão internacional de
contabilidade se caracteriza, principalmente, pela relevância do julgamento da
administração, no que concerne ao reconhecimento, à mensuração e à divulgação
das operações e dos eventos financeiros, pela busca do valor justo dos bens,
direitos e obrigações e pela aproximação do resultado do exercício com a
geração de caixa. Dessas características decorrem diversos lançamentos que
impactam a apuração do lucro (ou do prejuízo) da empresa, dentre os quais se
destacam: mudança no critério de
depreciação dos bens do ativo imobilizado, inclusive com a estimativa do
respectivo valor residual; ajuste a valor presente; avaliação de ativo
biológico etc. Com relação aos aspectos societários e tributários do lucro
apurado no contexto do IFRS, as questões são: qual a medida desse lucro que deve ser distribuída aos sócios
obrigatoriamente e qual a medida desse lucro que estará isenta do imposto sobre
a renda. [Boa pergunta! Como diria um professor que conheço: Isso pode dar
um tese!]
Do ponto de vista
societário, conquanto a modificação da Lei nº 6.404, de 1976, trazida pela Lei
nº 10.303, de 2001, que fortaleceu a regulamentação legal da governança
corporativa, tenha aumentado os direitos patrimoniais dos sócios, especialmente
dos minoritários, essa mesma alteração já garantiu, ao menos em parte, a saúde
financeira das empresas. Nesse sentido, na composição do dividendo obrigatório
foi ressalvada a parcela de lucros a realizar, desde que constituída a
respectiva reserva. Em complemento, a alteração da lei societária promovida
pela Lei nº 11.638, de 2007, redefiniu a reserva de lucros a realizar.
Atualmente,
constituem a reserva de lucros a realizar o resultado líquido positivo da
equivalência patrimonial e o lucro, rendimento ou ganho líquidos em operações
ou contabilização de ativo e passivo pelo valor de mercado, cujo prazo de
realização financeira ocorra após o término do exercício social seguinte.
Em ambos os casos o que se tem é a
geração de lucro sem a sua respectiva realização financeira, ou, em outras
palavras, sem geração de caixa; o que ocorre no reconhecimento contábil, por
exemplo, dos lucros gerados por subsidiária no exterior, pela mensuração de
ativo biológico e pelo ajuste a valor presente. Dessa forma, a lei societária optou pela perpetuidade da
empresa (preservação financeira) em detrimento dos direitos patrimoniais dos sócios
(acionistas ou quotistas).
Do ponto de vista
tributário, o Regime Tributário de Transição - RTT estabelece que os registros
contábeis efetuados com base nos IFRS não devem ser considerados para fins de
apuração dos tributos sobre a receita (Contribuição para o PIS e Cofins) e
sobre o lucro (IRPJ e CSLL): trata-se da neutralidade tributária. Ocorre que
essa neutralidade tem que ser bem analisada e bem definida: de acordo com a lei
de regência, o RTT aplica-se à composição das receitas, dos custos e das
despesas, ou seja, aos itens que constituem a apuração dos mencionados
tributos. Dessa forma, a neutralidade do RTT não se aplica à matéria de ordem
societária com implicação tributária, como são os casos da remuneração de juros
sobre o capital próprio, da subcapitalização e da distribuição de dividendos
isentos.
Esse entendimento
parece ter sido corroborado pela Receita Federal do Brasil com a redação do
Parecer Normativo nº 1. Nesse documento oficial, foi admitida a coexistência de
duas despesas de depreciação, uma para efeito de determinação da base de
cálculo dos tributos sobre o lucro e outra para efeito de determinação dos
dividendos a serem distribuídos aos sócios. Como corolário necessário, tem-se
que o lucro para efeito de tributação é apurado na forma do RTT, enquanto que,
para efeito de distribuição de dividendos isentos do imposto sobre a renda, o
lucro será apurado com a observância do padrão internacional de contabilidade.
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