28 de nov. de 2011

O que é mesmo provisão em Contabilidade?


Segundo o CPC 25 (IAS 37) - Provisões, Passivos Contingentes e Ativos Contingentes:

Provisão é um passivo de prazo ou de valor incertos.

Passivo é uma obrigação presente da entidade, derivada de eventos já ocorridos, cuja liquidação se espera que resulte em saída de recursos da entidade capazes de gerar benefícios econômicos.

Evento que cria obrigação é um evento que cria uma obrigação legal ou não formalizada que faça com que a entidade não tenha nenhuma alternativa realista senão liquidar essa obrigação.

E aí, a Provisão para devedores duvidosos [PDD] se enquadra nesses conceitos? Realmente pode ser denominada de provisão?

Proteção jurídica da provisão contábil
Texto publicado no Valor Econômico em 17/06/2011, por Edison C. Fernandes

Recentemente, foi noticiado que a companhia Lojas Marisa teve uma redução de quase 5% na cotação de suas ações em razão de ter anunciado um ajuste na conta de provisão para devedores duvidosos - PDD. Esse fato nos faz questionar se uma “mera” informação contábil teria capacidade para interferir tão significativamente no valor das ações de uma companhia. A verdade é que as informações inscritas nas demonstrações financeiras deixaram de ser “meras” informações contábeis, impactando decisivamente na geração de valor das empresas. [Na verdade acredito que as informações contábeis nunca foram “meras” informações, mas houve épocas em que a Contabilidade prescindiu de evidenciar a essência econômica dos fatos, para primar pelos interesses de determinados usuários, o que a deixou um tanto desprestigiada... Mas isso já passou!]
Inicialmente, pode-se dizer que, de maneira geral, as informações contábeis são um meio de proteção dos direitos dos sócios (acionistas ou quotistas). Não por acaso, a legislação societária (seja a Lei nº 6.404, de 1976, a chamada Lei das Sociedades por Ações, seja o Código Civil, na parte do direito de empresa) possui capítulo específico sobre escrituração contábil, além de diversos dispositivos sobre fiscalização, prestação de contas e exibição dos livros comerciais, sendo tudo isso relacionado às demonstrações financeiras. Dessa forma, do ponto de vista do direito, o (primeiro) bem jurídico protegido pelas normas contábeis reside na relação societária e na garantia de perenidade da empresa.
É precisamente isso que acontece no caso da mencionada PDD. Se é certo que a contabilidade baseia-se em estimativas (por isso não se pode dizer que seja uma ciência exata, mas humana) [Não só por isso, mas por isso também!!!!], no caso das provisões, a importância das estimativas redobra. Embora a chamada PDD não seja tecnicamente uma provisão, mas um ajuste à conta de clientes (contas a receber), os seus fundamentos são semelhantes aos das provisões em geral e seu efeito contábil, exatamente o mesmo. [Na verdade existe uma discussão no IASB em torno de eliminar o termo “provisão” em relação às contas de ajustes de ativos, uma vez que o conceito de provisão se refere a passivo de prazo e valor incerto. Ora, a PDD, ou melhor dizendo PCLD, não constitui um passivo de prazo e valor incerto, mas efetivamente uma estimativa de perda de créditos a receber]

As informações contábeis são um meio de proteção dos direitos dos sócios
Em poucas palavras, a PDD serve para reconhecer na contabilidade a inadimplência dos clientes, já ocorridas e que provavelmente ocorrerão, normalmente, tomando como critério de estimativa o histórico dos créditos não honrados pelos clientes. Em uma companhia varejista, como a citada, vários fatores podem influenciar na inadimplência dos clientes, como, por exemplo, o aumento da inflação que venha a comprometer o poder aquisitivo dos consumidores. O efeito contábil da PDD é a redução de uma conta de ativo (clientes ou contas a receber), tendo como contrapartida o registro de uma despesa (que, diga-se, é indedutível na apuração dos tributos sobre o lucro), cuja finalidade é ajustar o lucro a ser distribuído aos sócios à provável geração de caixa (recebimento dos clientes) - com isso, resta garantida a perenidade da empresa, elemento essencial do direito de sócio.
A garantia da perenidade da empresa (proteção jurídica dos sócios, especialmente, os minoritários) também é protegida pelas demais provisões, tais como a provisão para garantia e as provisões para contingências (cíveis, tributárias, trabalhistas, ambientais etc.), essas sim, tecnicamente “provisões”. Acontece que essas provisões são, igualmente, proteção jurídica para os credores, e não apenas para os sócios. De um lado, a proteção jurídica de consumidores que estão confortáveis em razão de o fornecedor oferecer assistência técnica aos produtos adquiridos (provisão para garantia), de outro, a proteção jurídica de potenciais credores da empresa, porque as discussões cíveis, trabalhistas, ambientais e tributárias podem ser decididas a seu favor, obrigando a empresa ao pagamento do devido, cujos recursos terão sido garantidos pela provisão e seu efeito contábil.
A constituição de uma provisão contábil não significa reserva física de recursos financeiros, ou seja, que o dinheiro ficará guardado esperando a conclusão da situação litigiosa, carimbado para esse fim, como ocorre no caso dos depósitos judiciais. A empresa poderá, livremente, dispor desse montante em moeda para a condução da sua atividade e dos seus pagamentos cotidianos; ela não poderá, entretanto, entregar esses recursos financeiros aos sócios, transferindo-os do seu patrimônio para o patrimônio dos sócios, porque, nesse caso, o retorno de tais recursos poderá ficar bastante comprometido. Portanto, a finalidade jurídica da provisão contábil é proteger o sócio, por garantir a perenidade da empresa, e também proteger eventuais credores, por assegurar que a empresa (eventual devedora) não vai transferir seus recursos financeiros aos sócios em prejuízo do futuro pagamento da dívida, no caso de decisão que lhe seja desfavorável.

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