A ordem econômica ambiental brasileira
Texto publicado no Jornal Valor Econômico (26 Out. 2009)
Autoria: Svetlana Maria de Miranda
Foi-se o tempo em que a natureza podia ser concebida como infinita e colocada em toda a sua plenitude a serviço da satisfação humana. Desde a década de 60, fundamentada na Hipótese Gaia - que define o planeta Terra como um organismo vivo e inteligente, capaz de superar situações de desequilíbrio ameaçadoras à vida e de criar novas condições de sobrevivência mesmo que isso exija grandes adaptações das espécies -, verificou-se que os modelos de desenvolvimento exercidos foram determinantes não só para melhorar a qualidade de vida humana, mas também, para proporcionar um corpo de ameaças e transformações ecológicas sobre as quais não se tinha qualquer controle.
Os reflexos dessa discussão planetária fizeram-se sentir de forma mais acentuada no Brasil quase 20 anos depois. Marcos como a Política Nacional do Meio Ambiente, a criação de agências de fiscalização e os programas setoriais, sinalizavam uma nova sensibilidade do Estado às pressões da opinião pública e dos movimentos ambientalistas.
Na Constituição Federal de 1988, o meio ambiente mereceu tratamento preciso e moderno, reconhecendo-o como um bem jurídico autônomo e portador de substantividade própria, essencial à sadia qualidade de vida.
Paralelamente ao inafastável dever de preservação, a obrigatória compatibilização das atividades econômicas com a defesa do meio ambiente é também uma premissa constitucional, conforme se depreende da análise do Título VII dedicado à matéria.
Nesse contexto e, consequentemente, na reestruturação das leis de mercado em virtude do novo quadro mundial regulador, tornou-se imperativo para o exercício regular das atividades econômicas, a consideração das contingências ambientais dentro de um procedimento contínuo de crescimento, seja por pressões externas, seja pela ameaça iminente de esgotamento da matéria-prima e insumos do próprio processo produtivo.
Nessa seara, influenciadas pelo quadro acima demonstrado e preocupadas com a sustentabilidade dos negócios de seus clientes, as Bolsas de Valores iniciaram um processo de adequação das avaliações de riscos das empresas, e inseriram a variável ambiental em seus indicadores de análise.
Como exemplo, quase 10% dos itens de qualificação ponderados no Dow Jones Sustainability Índex diz respeito às políticas de controle e redução das emissões de gases de efeito estufa, às características do modelo energético adotado e às estratégias de mitigação climática. Já na Bovespa, o Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) possui indicadores específicos referentes à gestão ambiental da empresa e do seu compromisso de redução de emissões de gases de efeito estufa.
Nesse todo, podemos citar também a Lei Sarbanes-Oxley (Sarbox) que exige das corporações que estão sob a sua égide, o monitoramento e transparência sobre qualquer fato, situação ou condição, que possa repercutir, negativamente, sobre receitas, lucros, participação de mercado e/ou posição competitiva da empresa, dentre eles, os aspectos ambientais.
Desse modo, os impactos sobre a indústria brasileira foram significativos. A necessidade de cumprir os requisitos legais e as demais diretrizes setoriais fez com que 85% das indústrias brasileiras adotassem, durante os anos 90, algum tipo de procedimento associado às questões ambientais de sua atividade. E para aquelas com inserção internacional, a necessidade de ajuste às novas exigências não se limitou às nossas fronteiras. Sobre elas recaíram as chamadas barreiras verdes, resultantes dos padrões ambientais mais restritivos por parte dos países desenvolvidos, compradores, em sua grande maioria, do produto nacional.
Como resultado, em recente relatório, a Associação Brasileira das Empresas do Mercado de Carbono (Abemc) narra que as empresas brasileiras têm uma postura avançada em relação à questão da sustentabilidade do planeta, em comparação a de outros países em desenvolvimento com base no projeto denominado "Carbon Disclosure Project" (CDP).
Entretanto, apesar de todo esse quadro positivo, há ainda muito por fazer. A última análise do setor industrial realizado pela CDP, sobre a emissão de gases de efeito estufa, focada especificamente na cadeia de fornecedores de matérias-primas, embalagens, suportes logísticos, dentre outras atividades, das 34 maiores multinacionais, constatou-se que (i) entre 40% e 60% das emissões totais de gases de efeito estufa apontadas nos inventários das multinacionais, provêm de suas cadeias de fornecedores; (ii) 42% desses fornecedores informam não identificar o risco que uma alteração no clima representa às suas operações; e (iii) 1/3 alegam não enxergar no seu processo alguma ameaça ao atual cenário climático mundial.
Mas há esperanças e previsões de futuros pródigos. A conclusão do estudo elaborado pela Mckinsey acerca da matéria Caminhos para uma economia de baixa emissão de carbono no Brasil aponta, dentre outras considerações, que o Brasil é o quarto maior emissor de gases causadores de efeito estufa e é o que possui o maior potencial de reduzi-las. Comparado ao resto do mundo, o Brasil tem sozinho 5% das oportunidades de abatimento nas reduções das emissões de gases de efeito estufa, o que indica uma excelente justificativa para investimentos e, claro, de mobilização do setor empresarial nesse sentido.
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